sábado, 3 de novembro de 2007

RELIGIÕES AFRO LUTAM CONTRA À INTOLERÂNCIA RELIGIOSA



Noticias nos jornais de 02 de novembro de 2007

Folha de Pernambuco (Caderno Grande Recife)

Religiões afros pedem passagem

“Ará agô bíye axé”. Do yorubá ao português, “o povo pede licença com orgulho da força”.
No contexto do manifesto que parou o trânsito nas avenidas do centro do Recife na tarde de ontem, o povo esteve representado pelos seguidores dos cultos afro-religiosos. O ‘orgulho da força’ denotou a adoração dos fiéis aos deuses orixás. Já o ‘pedir licença’ foi o principal motivo da caminhada: o fim da intolerância religiosa.
O Manifesto dos Terreiros de Matriz Africana, na luta contra todas as formas de preconceito e intolerância religiosa, reuniu seguidores do Candomblé, Umbanda, Kimbanda e diversas nações como Nagô, Ketu, Jurema e Angola. Música, dança, rezas, lavagem das ruas com ervas-de-cheiro e o grito pela liberdade puderam ser vistos na caminhada, que marcou o início do Mês da Consciência Negra, instituído em razão da morte de Zumbi dos Palmares em um 20 de novembro. “Ao invés de invasão aos nossos terreiros e humilhações públicas, nós desejamos o interesse no conhecimento e respeito a toda diversidade”, afirmou Elza Torres, mais conhecida como Mãe Elza.
Uma multidão acompanhou de perto as manifestações. No trânsito das avenidas Conde da Boa Vista, Guararapes e Dantas Barreto, alguns demonstraram impaciência pelo tráfego parado. No entanto, a maioria aprovou a passeata. Foi o caso da professora Tereza da Conceição. “Cada um tem o direito de ter e manifestar sua religião. Se eu estivesse no lugar deles, também desejaria o respeito e a atenção”, revelou. A caminhada teve fim no Pátio do Carmo.

Jornal do Commercio

JC nas Ruas ( caderno Cidades)
» CONSCIÊNCIA NEGRA
Cerca de três mil adeptos da umbanda e candomblé participaram ontem da I Caminhada de Terreiros de Matriz Africana, no Centro, para dar um basta à discriminação e à intolerância religiosa. O ato marcou a abertura do mês da Consciência Negra.
Diário de Pernambuco (caderno Vida Urbana)
Mães-de-santo fazem ato no centro

MOBILIZAÇÃO. Primeira Caminhada de Terreiros de Matriz Africana chamou atenção para a intolerância religiosa da sociedade
Jane tem 60 anos de vida. Ontem ela saiu de casa com seu vestido branco, colares coloridos e brincos dourados. Maquiagem leve e batom vermelho. Estava pronta para a uma celebração histórica. "Pela primeira vez, estou saindo para as ruas, estou vindo gritar pelo meu povo, pela tolerância religiosa. Para mim, é um dia de glória", disse uma emocionada Jane. Ali, Mãe Jane. Cinqüenta anos de "santo". Um dos símbolos maiores dos Terreiros de Matriz Afriacana em Pernambuco. Filha de família católica, aluna de colégios de freias, aos 8 anos diz que começou a receber as primeiras "manifestações". A repressão começou dentro de casa. A sua luta também. Em cima de um trio elétrico, por volta das 18h, em uma movimentada e congestionada Avenida Conde da Boa Vista, Mãe Jane discursou sua ideologia religiosa. Cantou para Ogun. Falou dos seus deuses. No asfalto, centenas de adeptos das religiões africanas a acompanhavam. Representavam 30 grupos de candomblés do estado. Nas calçadas, nos ônibus, nas janelas dos edifícios, por trás das vitrines das lojas, todos paravam para ver. Aquela era a primeira Caminhada de Terreiros de Matriz Africana que seguia pelo Recife. Claro que não era difícil flagrar alguns olhares desconfiados, jovens de mochilas nas costas dançando com visível ironia no ritmo dos batuques, ou mesmo quem comentasse baixinho que aquilo era coisa de macumbeiro. Exceções particulares. Se o discurso do movimento - que inevitavelmente fala de resistência histórica, da escravidão e da perseguição das ditaduras políticas - pedia respeito, pode-se dizer que encontrou o que buscava pelo caminho. Encontrou uma sociedade aberta, sem qualquer demonstração pública de rejeição ou enfrentamento ideológico. Era o Dia de Todos os Santos. Mãe Jane possui a 40 anos um Terreiro na Cidade Tabajara, em Olinda: o Ileaxéloya Egunyta. Em quatro décadas viu as mudanças na relação entre os Terreiros e a sociedade - sobretudo dentro das comunidades em que estão instalados. Hoje ela se divide entre religião, política e ações sociais e culturais. Participa ativamente de dezenas de movimentos. Recebe cestas básicas e leite do governo e tem o dever de distribuí-los entre outros centros religiosos. Dentro da sua casa, criou um núcleo de informática para capacitar jovens carentes. E ainda organiza campeonatos de futebol e festas folclóricas (como quadrilhas de São João) na comunidade. Todo esse trabalho tende a se intensificar com o Mapeamentos dos Terreiros, que vem sendo realizado pelo governo do estado - justamente para poder investir no potencial social desses locais. "Ainda assim, sou muito criticada. E ainda há muita repressão contra as religiões de matriz afriacana. Muitos católicos e evangélicos vão ao terreiro, mas não revelam. Como se estivessem fazendo algo errado", conta Mãe Jane.O sincretismo religioso - revelado por Jane - surgiu desde a época da escravidão. A aproximação com o catolicismo foi uma espécie de forma encontrada pelos escravos para resistir a perseguição. "Ainda existem muitos que se dizem católicos, mas que são adeptosdo candomblé e têm vergonha de assumir", completa Pai Ivo, do Terreiro Xambá, no Quilombo do Portão do Gelo.


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